A cultura de um povo é toda a sua memória.


terça-feira, 25 de maio de 2010

Casa Adriana e Palácio do Governador


E-mail à Ângela a propósito da Casa Adriana e do Palácio do Governador

Oi, Ângela (…), na verdade, esse raciocínio usa-se na arquitectura e no urbanismo, essa comparação de modelos e tipos que nos são familiares. O que dá imponência à Casa Adriana, tem a ver com essa apropriação dos morros muito típica por ali (a Casa Adriana, a Casa de Pedro Neves, a casa dos meus avós, Alfredo e Lilica Marques / da Silva, e tantas outras), seguida pelos cortes de terreno e contrafortes que chegaram depois com o rasgar das vias. Se isso pode ser uma descontinuidade nas cidades, o que é negativo, não deixa de ser uma característica dessa parte alta da cidade, logo, a sua identidade que não se deverá falsear ou alterar com ligeireza. Ora, essa escadaria gigantesca, diga-se de passagem, com um portão (central) minúsculo (talvez porque a escadaria não deixa de estar relacionada com o grande portão lateral) acaba por “elevar” os jardins ou espaço exterior, o que é esplêndido. Isso não é consequente, em certo sentido, porque não está virado para uma paisagem, se não, as casinhas de rendimento, aliás, também elas, fazendo parte da antiga propriedade de Dr. Jacques de Salis di Celerina / Casa Dr. Adriano Duarte Silva. Contudo, esse conjunto é relançado na paisagem, no canto que dá para a avenida, aliás, com vista para a Baía e o próprio Monte Cara. Ora, esses espaços exteriores, já o tinha dito nos tais apontamentos breves que fiz por ocasião das lutas pelo Eden-Park, são raros em Mindelo. E a nossa cultura não se define pela cultura do outro. Mas empobrece-nos cada vez que demolimos uma dessas tipologias arquitectónicas e morfologias urbanas que nos falam do nosso passado e explicam quem foram os nossos e quem somos nós. Também da parte elevada em mansarda (1.º andar) acaba por se ver a paisagem envolvente. Ainda hoje, a partir de vários pontos se vê aquele “cocuruto”, omnipresente, quase, como um farol, dir-se-ia. Visualmente, pois, havia esse eixo, sim, esse enfiamento visual que deve ter tido uma vista excelente, pelo menos, antes de alguns abortos que surgiram pela frente. Já no Palácio do Governador a imponência é obtida por outros recursos, desde logo, o próprio edifício e a sua posição estratégica na cidade, de frente para a Rua de Lisboa, mas sem qualquer relevância digna de nota, que se veja de fora, creio eu, para os seus espaços exteriores, quer dizer, para além da galeria inferior. Ou seja, de facto, são exemplos que rivalizam, aqui e acolá, por atributos diferentes, e que, é o que mais importa, e já está dito por ti, juntos constituem exemplares dos mais ricos, sejam “ricos”, ou não, no contexto internacional, que nós possuímos e merecem um lugar no nosso património cultural classificado. Se não classificarmos isso, o que teremos para classificar? Bom, acabei por pensar em voz alta aqui contigo, talvez fiquem umas ideias para depois trabalharmos. Abraço. Nuno

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