O PATRIMÓNIO ARQUITECTÓNICO E HISTÓRICO DO MINDELO TEM OS SEUS DIAS CONTADOS?
Aquando da minha última estadia na cidade do Mindelo, em conversa com várias pessoas e através da leitura de um artigo de opinião da autoria do deputado Maurino Delgado, publicado no Terra Nova, tive conhecimento das ameaças que pairam sobre o património histórico e arquitectónico da cidade. Desde a independência muitas referências da ilha de S. Vicente vêm sistematicamente desaparecendo.
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Começou-se pela eliminação da praia da Matiota, a descaracterização da Praça Estrela e da parte traseira do edifício da Câmara Municipal, a demolição do edifício da antiga Fazenda, do PIC-NIC, do Miradouro Craveiro Lopes etc. Será que o Palácio do Governo, a réplica da Torre de Belém ou o “pássaro”, monumento comemorativo da travessia do atlântico por Gago Coutinho e Sacadura Cabral, têm os seus dias contados? Qual será o próximo a ser sacrificado nesta bulimia destrutiva que tomou conta da cidade do Mindelo? Neste momento está em causa, embora parece que haja alguma hesitação por parte das autoridades, a destruição pura e simples de mais um ex-libris da cidade, a casa do Dr. Adriano Duarte Silva, homem de qualidades humanistas e que muito lutou pela defesa dos interesses da terra. Também soube que o Fortim o Madeiral estão ou estiveram na calha.
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É incompreensível quando se assiste à elevação da Cidade Velha ao estatuto de maravilhas do mundo português e de património da humanidade, que o governo de C. Verde não actue no sentido da protecção e preservação do património da cidade do Mindelo, ou pior autorize a sua destruição. Talvez desconheçam a história do Mindelo e dos ilustres protagonistas que contribuíram para o progresso da ilha. Também, não se percebe como é que uma cidade que se diz capital cultural de C. Verde, apelação hoje em dia muito contestada, e com razão, devido ao estado avançado da decadência da ilha, não tenha ainda um Museu digno do seu nome. A preservação da casa do Dr. Adriano Duarte Silva devia ser feita numa óptica da sua transformação em Museu da Cidade.
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A cidade do Mindelo foi planeada e traçada pelos ingleses, que lhe imprimiram um estilo arquitectónico único em C. Verde. Os portugueses e os caboverdeanos, contribuíram em seguida para a definição de uma cidade bela e harmoniosa que encanta todos os que a visitam. A independência correspondeu a um período charneira para a cidade do Mindelo. Com ela a nova geração de arquitectos e engenheiros que tomou conta da câmara, muitos deles formados nas escolas do leste europeu, imprimiram à cidade um novo estilo arquitectónico que veio chocar com tudo o que se fazia antes.
A cidade do Mindelo foi planeada e traçada pelos ingleses, que lhe imprimiram um estilo arquitectónico único em C. Verde. Os portugueses e os caboverdeanos, contribuíram em seguida para a definição de uma cidade bela e harmoniosa que encanta todos os que a visitam. A independência correspondeu a um período charneira para a cidade do Mindelo. Com ela a nova geração de arquitectos e engenheiros que tomou conta da câmara, muitos deles formados nas escolas do leste europeu, imprimiram à cidade um novo estilo arquitectónico que veio chocar com tudo o que se fazia antes.
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Como já disse o primeiro atentado à cidade do Mindelo surgiu com a justaposição de um prédio na parte traseira da câmara Municipal e seguiu-se à destruição do edifício da Fazenda. A partir daí nunca mais o trabalho de demolição parou. Desrespeitando o estilo colonial do centro da cidade que até então, salvo casos excepcionais, raramente era posta em causa, a nova burguesia começou a construir cada vez mais em altura, em geral na periferia da cidade, para aos poucos atingir o seu centro nevrálgico. Hoje, o perigo é maior, a especulação imobiliária. Quarteirões inteiros, incluindo casas de estilo colonial, foram abatidos ou estão na calha para serem substituídos por empreendimentos imobiliários imponentes, numa clara tendência de instaurar no centro histórico da cidade o domínio do betão.
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As autoridades alegam que não podem impedir que os donos das casinhas típicas do Mindelo, muitas vezes emigrantes, realizem o seu sonho, em construir como bem entenderem. Embora este anseio seja legítimo, a Câmara Municipal tem a responsabilidade de preservar e legar para as gerações futuras um património que herdou. Ela deve ter uma política urbanística para a cidade, mais exigente, e que defenda os interesses da cidade. Basta passar pela rua do Côco, Suburbana e da Moeda, para constatar a situação calamitosa do urbanismo em Mindelo: essas ruas estão irreconhecíveis.
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A lista das aberrações que pululam pela cidade é enorme, incluem o prédio do MindelHotel, o mamarracho construído atrás do Centro Nacional de Artesanato (edifício que albergava a Rádio Barlavento) e vários novos prédios que crescem como cogumelos e de maneira desordenada pela cidade, completam o seu panorama actual. Abatem-se casas típicas da cidade ou casas de estilo colonial, e substituem-nas por autênticos caixotes inestéticos, muitas vezes salientes e de vários andares, desalinhados dos restantes edifícios. A este ritmo daqui a poucas décadas Mindelo ficará irreconhecível, perderá para sempre o seu centro histórico, e transformar-se-á na cidade campeã dos ‘mamarrachos’, e a capital do estilo ‘kitch’.
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É contra esta tendência que os mindelenses devem lutar, pois se perderem a sua cidade também perderão para sempre a sua identidade. Tendo em conta o seu património arquitectónico, Mindelo tem potencialidades para se constituir num produto cultural e turístico de excelência, representando um investimento com forte potencial e valor acrescentado, pelo que a sua desfiguração põe em causa este trunfo importante. Por outro lado, não se percebe a tendência actual em construir em altura no centro da cidade quando a tendência mundial é precisamente o contrário, isto é no sentido de restaurar as partes antigas das cidades. Claro que há muitas casinhas que não constituem património nenhum e que podem ser abatidas.
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O que está em causa é o frenesim de construção onde não se respeita a linha arquitectónica existente. Muitas das cidades da Europa têm uma designação ‘A Nova’, sobretudo cidades do norte da Europa, francesas, alemãs, holandesas etc, que corresponde a áreas delimitadas onde o moderno emerge sem interferir com o antigo. Faria bem aos nossos arquitectos que viajassem pelas pequenas cidades europeias e visitassem as zonas turísticas do mediterrâneo francês para ver como é que se conseguiu recuperar sítios inteiros da corrosão do urbanismo e se tipificaram vilas e cidades a património histórico. Convido-os, por exemplo, para uma viagem pelo sul da França, para conhecer a típica vila provençal de Bormes-les-Mimosas, ou as cidades de Hières, Toulon, St. Tropez, Carcassone, Biarritz, etc, pois aí poderão ter muita inspiração nos seus projectos urbanísticos e reciclar os seus conhecimentos.
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Estamos portanto em Mindelo em contra-ciclo com aquilo que se pensa e se faz actualmente no Mundo moderno e civilizado, cometendo os mesmos erros que na Europa durante o período de crescimento dos anos 50 e 60. Antes que seja tarde demais e que reste da cidade somente um amontoado de prédios, os mindelenses têm que se solidarizar em defesa do património da sua cidade, que é também de C.Verde.
Temos de apostar num Mindelo que recupere a sua identidade, sem medo da história antiga, que alguns intitulam de colonial no seu sentido mais pejorativo.
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